quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Sinto os olhares, num desconforto que não sei dizer. Subo a rua numa suposta indiferença que não é. olho as montras sem manifestar grande interesse e sigo num vagar propositado. Alguns vendedores aproximam-se mais, alguns atrevem-me a tocar-me no braço, misturam as palavras numa desordem de línguas e de gramática, tal e qual as lojas desarrumadas. tentam adivinhar a minha origem, eu sei. Acham-me provavelmente italiana. Menos espanhola. Raramente francesa. Nunca, por nunca, portuguesa. É engraçado este jogo de adivinhas. Fico parada a olhar uma gaiola dourada. Lindíssima, trabalhada até ao limite numa arte de arames e de cores. E eu,
pode ser bonita uma prisão?
Estou rodeada de pequenos homens, quase patéticos nos passinhos de chinês e no esforço sofridamente patético por me venderem uma gaiola. Mas eu,
-Estou só a ver, não quero
Ver e não querer. Não combina, é pouco provável para eles. Por isso as vozes alargam a intensidade e cada vez aumenta o número de homens á minha volta. Não sei de onde vieram. As mulheres ficam longe, observam. Expectantes, meio escondidas nos seus lenços negros, que lhes asseguram um suposto direito a virtudes obrigatórias. os homens parecem cada vez mais febris. Alguns trazem enormes gaiolas nas mãos, o que me assusta. Parece que me querem meter lá dentro, o que me assusta...

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